sábado, 17 de setembro de 2011

Sacada

Lembro da noite em que eu voltei a escrever.
Foi naquela sacada sentada à mesa com o notebook a frente e uma página em branco. Eu queria muito falar, só não sabia o quê, nem como ou pra quem.
Acho que na verdade eu precisava falar pra mim mesma.
A sacada não era novidade, vivia ali. Era o que me tirava daquele cantinho da loucura, era a única parte externa daquele apartamento, cenário da época em que eu me perdi mais. Hoje, olhando pra trás, não consigo imaginar como eu vivia entre aquelas paredes, como o vermelho de fundo da sala não me fazia pular da sacada logo ao lado. É verdadeiramente apavorante lembrar de todo aquele conjunto de coisas que te levaram a insensatez.
Insensata, acho que é essa a palavra. Bonita até, bonita demais pro que foi.
Eu não escrevia desde aquele prêmio que ganhei da Prefeitura da Cidade. Lembro como se fosse ontem, a gente saindo de casa, arrumadinhos pro evento. Eu, num vestidinho verde e de franjinha, com aquele misto de nervosismo e orgulho porque ia ler lá na frente de todos. Com direito a subir ao palco e tudo mais. Papai, mamãe e namorado no carro. O irmão, pra variar, não foi. Namorado, o primeiro... e eu era tão menina! Depois sumiu, dói até hoje, dói sim.
E naquela sacada as palavras saíram de mim, mais arrancadas do que qualquer outra coisa. Era pra ser aquilo, não era eu a dona da situação.
E a menina que eu ainda não conhecia mas que, curiosamente também estava no dia em que eu li meu último texto foi a que mais me encorajou a continuar.
E eu louca, louquinha, doida de pedra, continuei. Era isso que me fazia escrever. Mostrar pra Helen, mostrar pra Flor, criar a Flor que antes era Hortencia. Eu queria esquecer a Hortencia, deixar ela no passado, criar nova identidade, quem sabe tirar até passaporte. Mas antes de tudo, sumir por aqui mesmo, pra Bahia. Lembra?
E pra tornar tudo mais engraçado ainda, o apartamento da Loucura ficava do lado da antiga casa dele, mesmo quarteirão. Ainda dói.

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