sábado, 22 de janeiro de 2011


Queria abrir aquela garrafinha e entrar naquele mundo.
Saboreando de pouquinho a pouquinho as gotas dispersas de forma aleatória no gargalo dela. Queria molhar meus pés nelas e ir seguindo, admirando as cores refletidas tão de leve, tão de mansinho.
Olhei pra trás, continuei a admirar e, de supetão, escorreguei.
Aquele vidro, tão liso, sem saliência alguma, toda paciência, eficiência em ser simplesmente o que deveria e nada mais. Eu parei um tempo pra pensar. Quanta sinceridade aquele vidro carregava! E quanto peso, quanta responsabilidade.
Olhei pra fora, aquela cor só me fazia me sentir mais e mais adentro da garrafa. Escura, mal revelava o que quer que poderia estar depois daquela fina camada que me separava de tanto.
Uma músiquinha calma começou a tocar, me recuperei do tompo, me recuperei dos pensamentos.
Levantei-me, ri um pouco do descuido, achei bonito aquilo. Charmosa distração.
Ensaiei alguns passos, com cuidado, claro, no ritmo daquela baladinha triste que levava meu Coração consigo. E por mais lenta que fosse, o Coração desgarrou e foi na frente, rápido demais para que eu pudesse alcançá-lo e recuperá-lo. Ainda no meu campo de visão, deixei-o partir. Ao menos alguém ali era corajoso o suficiente pra ir em frente e não somente a frente.
A frente eu sempre fui. Ou ao menos sempre fingi muito bem pra mim mesma que ía. E as pessoas acreditavam fielmente. Acho que as aulas de teatro sempre me ajudaram muito.
O cheiro começou a ficar cada vez mais forte e me tomou por completo Fiquei zonza por alguns segundos.
Mas eu precisava tragar uns goles daquele líquido, mesmo.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Rua 15 de novembro, nº 203

Me entregaram um manuscrito, com um nome completo, seguido de algumas intruções.
Deram-me também uma senha e um meio para contato.
Saí de lá perplexa, nas mãos, aquelas folhas que pareciam amassadas propositalmente, no coração dor tamanha.
Um estranho esbarrou-me com força enquanto meus olhos fitavam um poste adiante. Virei-me e ele me olhava como se estivesse a captar detalhes para desenhar-me. Desconfortável, continuei a andar.
Espiei o relógio com um pouco de receio de que alguém pudesse estar me vigiando e reparando que naquele simples ato, havia desespero, uma multidão de pensamentos que engoliam a minha alma, mas não a incorporava. Deixando-a só, solta, séria.
Apressei os passos e ao atravessar a rua, por descuido, quase fui pega por um automóvel com pressa.
O som da buzina e do grito que veio a seguir foram os últimos que meu ouvido saboreou.
Atônita, parei. São cinco, mas se lhe falta um, é como se todos os outros tivessem ido embora juntos. Me certifiquei de que não fosse engano meu. Uma consequência da pressão imoral que a ansiedade exercia em mim.
Infelizmente, não. Resisti em continuar, afinal, como poderia?
Mas algo me puxava, a razão, não sei. Algo insistia para que eu colocasse pé ante pé e mesmo sem escutar os barulhos que os sapatos faziam ao encontrar o chão, focar no que havia de ser feito.
Mais alguns e logo adiante uma esquina. Contornei-a agora num ritmo mais lento, atenta.
E ali estava, quase que de braços abertos a me esperar.

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Mon Petit

Digo em voz alta que é hora de dormir e você dá de ombros, finge que não é contigo.
Então te vejo dirigindo-se até o quintal. Solto meias palavras e você logo desiste, vem ao meu encontro.
Fecho a porta a minha frente, deixando-a agora às minhas costas. Enquanto escovo meus dentes vejo você me observar pela meia luz que o banheiro faz com a sala, envolta na mais silenciosa escuridão.
Me entrego à mesma quando me dirijo ao quarto, tateando vagarosamente o que me rodeia. Sensação estranha, mas deliciosa ao mesmo tempo.
Deitamo-nos e sem sono, aceito tuas brincadeiras que me arrancam risadas. Mas, logo zango-me e explico-lhe que faz-me cócegas e que assim, não gosto.
Pois bem, foco novamente na tentativa de dormir. Mas não te aquietas e me faz brigar de novo, de novo e de novo.
Até que me rendo. Encostas perto dos meus cabelos e feliz, deixa-me em paz.
Acontece que não percebo que te encolhes até ficar demasiadamente pequena para chegar ainda mais perto.
Irrito-me, e assim vamos cada uma para um lado.
Você para na altura da minha barriga e Petit, como lhe chamam, pede abrigo através de alguns miados.
Desisto, afinal, quem não adocica um pouco a voz ao falar com um gato?

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Vou-me embora
Vou-me embora, bora?!
Mas não vou lá pra Trindade