sábado, 19 de março de 2011

Chapéu Panamá

Subi os quatro lances de escada revirando minha lista mental de remédios, imaginando se algum serviria para aquilo que eu sentia.
Lembro-me até de ter pensado em perguntar à Fernanda se ela também estava sentindo o mesmo, mas sem saber descrever o quê, desisti.
Aquela sensação estranha só passou quando eu me vi sentada ao chão do box com as pernas entre os braços enlaçados, o barulho do chuveiro ligado e as lágrimas se misturando àquelas águas que tinham o mesmo destino: o ralo.
Quando ela surtou de medo - o que é extremamente raro - eu sabia exatamente o discurso heróico que a manteria naquele restaurante tempo o suficiente para eu pensar no que fazer e não me jogar nas ruas como de costume: da forma mais inconsequente e corajosa que havia no mundo.
Ao conseguir convencê-la a comermos antes de irmos tentava brincar com a situação no intuito de distrair aqueles olhos assustados que vigiavam a rua incessantemente e por isso, mal piscavam. E que de tempo em tempo, se desesperavam me dando a dúvida de que eu teria a capacidade de contê-los.
Talvez o medo não me encontre há um bom tempo, mas quando me vi tendo de voltar da última rua até a minha casa sozinha, após toda aquela situação, ele me tomou.
Mas, sem titubear, deixei aquele par de olhos em segurança e mais dois: um de quem não queria saber o que estava acontecendo e outro que por mais que quisesse, não conseguia.
Ali estava eu, de imediato, cresci dois metros pro lado e meio pra cima e prossegui, sentindo os nódulos de tensão nas minhas costas e ao mesmo tempo, o peso de estar só.
Vigiei muito bem o meu caminho sem deixar transparecer e vinha bem, mesmo já tendo recebido uma ligação da Fernanda, um tanto preocupada por eu ainda não ter chegado.
Até que cinco metros antes de minha casa, eu cruzo pela segunda vez com aquela figura: blusa social branca aberta, mochilão nas costas e chapéu panamá.
O primeiro encontro já havia tido um grande impacto, não sei o porquê, senti que ele sabia demais.
Mas o segundo... o segundo me derrubou, me desarmou! Meus olhos encontraram os seus, redondos e profundos como a noite, que fizeram com que os meus abaixassem instantaneamente.
Por nada nem ninguém eu abaixaria os olhos durante aquela caminhada, afinal, eu tinha alguns metros a mais tanto para cima quanto para os lados. E quando meus olhos chegaram ao chão, eu me senti assim, pequena e frágil como aparento ser, e talvez umas quatrocentas e setenta e duas vezes mais sozinha. Me recriminei o quanto pude por aquela fraqueza.
Mas eu já estava ali, sentada ao chão do box com as pernas entre os braços enlaçados, o barulho do chuveiro ligado e as lágrimas se misturando àquelas águas que tinham o mesmo destino: o ralo.